Proposta de fim do recesso de julho expõe resistência interna e levanta questionamento sobre a real disposição da Casa em romper com antigos privilégios
A proposta de extinguir o recesso parlamentar de julho na Câmara Municipal de Cuiabá, apresentada pelo vereador Mário Nadaf (PV), reacendeu uma discussão antiga sobre os privilégios do Legislativo e a necessidade de modernizar a atuação parlamentar. O projeto, no entanto, só deve entrar em vigor em 2026, caso seja aprovado, o que levanta dúvidas sobre a real intenção de mudança da Casa.
O vereador Daniel Monteiro (Republicanos), que articula apoio e deve assinar como coautor da proposta, afirmou que não há tempo hábil para aprová-la em 2024, já que o recesso está previsto para começar no próximo dia 18 de julho.
“Mesmo que a gente aprove o projeto, não vai dar tempo. Tem que passar por dois turnos, ser sancionado… É impossível por uma questão de tempo mesmo”, explicou Monteiro em entrevista ao Jornal do Meio Dia (TV Vila Real, canal 10.1).
Uma Câmara com cara nova ou só maquiagem?
O debate ganhou força com o argumento de que o recesso de julho, somado às férias de fim de ano, totaliza 84 dias de folga por ano, número bem superior aos 30 dias de férias garantidos aos trabalhadores brasileiros. Para Nadaf e Monteiro, o recesso de meio de ano é um “mau exemplo” e a extinção dele seria um passo necessário para moralizar a atuação da Casa.
“A população está trabalhando, nós também deveríamos estar. Não precisa de recesso no meio do ano”, destacou Daniel.
A proposta, porém, ainda precisa de nove assinaturas para começar a tramitar, e, até agora, apenas sete parlamentares teriam manifestado apoio — cujos nomes não foram revelados por receio de pressão nos bastidores. Para ser aprovada, a emenda exige quórum qualificado de dois terços da Casa, ou seja, 18 votos em dois turnos.
Presidência resiste à mudança
A presidente da Câmara, vereadora Paula Calil (PL), se posicionou contrária ao fim do recesso, alegando que a pausa é importante para organizar a pauta de projetos, planejar as ações da Mesa Diretora e intensificar a fiscalização do Poder Executivo durante o período.
“É necessário o recesso parlamentar para que a gente consiga nos organizar. Eu, pelo menos, faço meu cronograma nesse período, e acredito que a maioria dos vereadores também”, justificou Calil.
Monteiro rebateu o argumento dizendo que, até 2026, haverá tempo suficiente para a Mesa se reorganizar e se adaptar à nova dinâmica de funcionamento sem o recesso.
Velhas práticas ainda resistem?
Com uma legislatura que se propôs a modernizar a Câmara e recuperar a imagem arranhada pela antiga pecha de “Casa dos Horrores” — marcada por escândalos, trocas de farpas públicas e falta de produtividade —, esperava-se mais firmeza nas ações para romper com antigos privilégios.
O projeto de Nadaf é, no discurso, um passo nessa direção. Mas, na prática, segue travado nos bastidores e adiado para o futuro, sem definição de prazo, sem apoio unânime e sem a urgência que a sociedade exige.
O que está em jogo?
-
30 dias de recesso em julho, somados a aproximadamente 54 dias entre dezembro e fevereiro;
-
Um total de 84 dias de inatividade legislativa por ano;
-
A possível inclusão de quatro sessões ordinárias a mais no calendário anual caso o recesso seja extinto;
-
Uma pressão crescente da sociedade por mais produtividade, transparência e comprometimento por parte dos vereadores.
Embora o projeto de extinção do recesso represente um aceno à moralização da atividade parlamentar, sua tramitação empacada e a resistência de lideranças da Casa revelam que os discursos de renovação ainda convivem com práticas antigas e pouco alinhadas à realidade da população.
Se a Câmara quer mesmo mostrar uma cara nova, precisa começar por atitudes concretas, não apenas promessas para daqui dois anos. Até lá, o eleitor segue observando — e questionando:
Câmara de Cuiabá está realmente mudando ou apenas maquiando os mesmos hábitos de sempre?














