Os vereadores Chico 2000 (PL) e Sargento Joelson (PSB), alvos da Operação Perfídia, retornarão à folha de pagamento da Câmara Municipal de Cuiabá mesmo estando afastados de suas funções parlamentares por decisão judicial. O restabelecimento dos salários foi determinado pela juíza Fernanda Mayumi Kobayashi, do Núcleo de Inquéritos Policiais (NIPO), que entendeu como abusiva a suspensão dos pagamentos feita anteriormente pela Mesa Diretora da Casa.
O ponto que mais chama atenção neste episódio não é apenas a controvérsia jurídica, mas o contraste entre a gravidade das investigações e a continuidade dos pagamentos integrais aos parlamentares afastados.
O que motivou o afastamento?
A Operação Perfídia, conduzida pelo Ministério Público Estadual (MPMT), apura um suposto esquema de corrupção envolvendo o pagamento de propina no valor de até R$ 250 mil para que os parlamentares votassem favoravelmente a um projeto de lei que autorizava a renegociação de dívidas da Prefeitura. Segundo as investigações, essa medida permitiu que o Município obtivesse certidões negativas e realizasse pagamentos a empresas credoras — entre elas, a HB20 Construções, responsável por obras do Contorno Leste.
Gravações e mensagens entre Joelson e um representante da empresa indicariam que o então presidente da Câmara, Chico 2000, estava ciente das negociações. Um depósito de R$ 150 mil, via PIX, teria sido feito a um intermediário ligado ao vereador. O conteúdo dessas provas levou ao afastamento cautelar dos dois parlamentares, a fim de preservar a integridade das investigações.
O que diz a Justiça?
A magistrada sustentou que o afastamento não implica perda de mandato e que a presunção de inocência deve ser respeitada até o trânsito em julgado da sentença. Além disso, afirmou que a suspensão de salários deve ser determinada exclusivamente pelo Poder Judiciário, não cabendo à Mesa Diretora da Câmara tomar essa decisão de forma unilateral.
A dúvida que paira: é legal, mas é moral?
A situação reacende um debate delicado sobre os limites da legalidade e da moralidade na gestão dos recursos públicos. Afinal:
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Se os indícios são suficientemente graves para justificar o afastamento, não são também suficientes para dar início ao processo de cassação?
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Como justificar o pagamento de salários a vereadores afastados, enquanto os suplentes já assumiram e também estão sendo remunerados?
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A manutenção do pagamento não representa um duplo gasto à Câmara, bancado pelos cofres públicos, mesmo diante de um afastamento por suspeita de corrupção?
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Não seria mais prudente aguardar a análise final das provas antes de afastar os parlamentares e abrir caminho para questionamentos judiciais e financeiros?
A decisão jurídica está amparada na Constituição, mas o efeito prático — dois vereadores afastados, dois suplentes nomeados, quatro salários sendo pagos com recursos públicos — traz um impacto direto à imagem da Câmara e da política local.
A sociedade cuiabana acompanha o caso com atenção. Mais do que nunca, espera-se transparência, responsabilidade e respostas claras sobre como e por que decisões como essa estão sendo tomadas.